Na
postagem anterior citei brevemente o texto Notas sobre
experiência e o saber de experiência,
de Jorge Larrosa Bondía. Hoje quero “explorá-lo” melhor por
achar que é um texto que nos sussita muitas reflexões sobre
diversas coisas em nossa vida, mas principalmente sobre nossa prática
pedagógica.
O
autor inicia o texto propondo pensarmos a educação a partir do par
experiência/sentido.
Segue chamando atenção para o que chamou de poder das
palavras. “Creio que fazemos
coisas com as palavras e, também, que as palavras fazem coisas
conosco” (BONDÍA, 2002, P. 21). O texto segue fazendo uma longa
exposição em que a “palavra” é extremamente valorizada pelo
autor.
O homem é um vivente com palavra. E isto não significa que o homem tenha a palavra ou a linguagem como uma coisa, ou uma faculdade, ou uma ferramenta, mas que o homem é palavra, que o homem é enquanto palavra, que todo humano tem a ver com a palavra, se dá em palavra, está tecido de palavras, que o modo de viver próprio do vivente, que é o homem, se dá na palavra e com palavra (BONDÍA, 2002, P. 21).
Aqui gostaria de fazer um contraponto citando o livro Vozes
plurais, da filósofa italiana Adriana Cavarero (2011). Neste
livro Cavarero resgata a unicidade da voz, que, segundo a autora,
perdeu seu status na Modernidade.
O primeiro lugar é ocupado por uma constatação tão simples quanto fundamental. A tradição filosófica não se limita a ignorar a unicidade das vozes, mas ignora a unicidade como tal, de qualquer modo que ela se manifeste. A singularidade inimitável de cada ser humano, a unicidade encarnada que distingue cada um de qualquer outro, é, para os gostos universalistas da filosofia um dado supérfluo, se não desconcertante, além de epistemológicamente impróprio. Por mais desestimulante que seja, isso não basta para liquidar a importãncia temática da voz. A voz não pode se tornar um tema indiferente para um tipo de saber que se inaugura na Grécia como autoclarificação do logos e que chega no século XX, após vários e coerentes desdobramentos que duram alguns milênios, à tematização obsessiva da linguagem (CAVARERO, 2011, p. 24).
Mas
voltemos a questão da experiência, que é o que mais me interessa
na narativa de Bondía. E para isso, cito uma frase do autor que dá
setido ao tema: A experiência é o que nos passa, o que
nos acontece, o que nos toca (p.
21). Não devemos confundir experiência com informação, pois a
informação impede que a experiência aconteça. O saber da
experiência é diferente do saber coisas, de acumular informações.
Bondía
atribui o “excesso de
opinião” que
atualmente estamos acostumados a ter sobre tudo e sobre todos, um dos
impedidores da experiência. “Para nós, a opinião, como a
informação, converteu-se em um imperativo” (p. 22). Também a
falta de tempo,
é fator desconstrutor da experiência. “Tudo o que se passa passa
demasiadamente depressa. E com isso se reduz o estímulo fugaz e
instantâneo, imediatamente substituído por outro estímulo ou por
outra excitação igualmente fugaz e efêmera” (p. 23). Excesso
de trabalho
também é as vezes confundido com experiência.
A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar,parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismoda ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço (BONDÍA, 2002, p. 24).
O
autor segue o texto escrevendo sobre o sujeito da experiência e o
que sobre o que a própria palavra experiência nos
diz. São reflexões igualmente maravilhosas, mas por hoje ficaremos
som essa primeira parte que já é bastante provocante.
Se
considerarmos a experiência como que Bondía, pergunto: o
que fazemos para proporcionarmos experiências aos nossos alunos?
Será que damos o tempo
necessário a eles para que ocorra a experiência? Quantas vezes nos
preocupamos em ocupá-los o máximo possível com tarefas, a fim de
que não parem de trabalhar... cobramos suas opiniões, oferecemos
excessivas informações...
Quando paramos para dar tempo a cada um dos nossos alunos pensarem,
acharem soluções...
E será que prestar mais atenção na voz, no som por si só, naquele que identifica cada pessoas por ele mesmo, com sua unicidade, como propõe Cavarero... não seria uma experiência?
E será que prestar mais atenção na voz, no som por si só, naquele que identifica cada pessoas por ele mesmo, com sua unicidade, como propõe Cavarero... não seria uma experiência?
Talvez
nas séries iniciais seja mais fácil dar tais oportunidades aos
alunos, porém esse processo se perde nas séries finais, seja pela
falta de recursos, “fatiamento do tempo” (DRUMMOND apud
OLIVEIRA et all,s/d),
ou tantos outros impecilhos que encontramos no dia a dia.
É
preciso ler textos como os de Bondía para nos “balançar”, no
fazer “parar para pensar” e dar tempo aos nossos alunos e a nós
mesmos, nos deixar ter experiências...
Referências
BONDÍA,
Jorge Larosa. Notas
sobre a experiência e o saber da experiência. Rev.
Bras. Educ. [on
line].
2002, n. 19, p. 20-28.
CAVARERO, Adriana. Vozes plurais: filosofia da
expressão vocal. Tradução: Flavio Terrigno Barbeitas. Belo
Horizonte: UFMG, 2011.
OLIVEIRA,
Cristiane Elvira de Assis et all. Questões
sobre o tempo no espaço escolar. s/d.
Disponível em:
<http://www.ufjf.br/espacoeducacao/files/2009/11/cc07_1.pdf>.
Acesso em 11 set. 2018.
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